Star Trek é demais. Pode parecer estranho para um blog que tem Jedi no nome começar um post assim. Mas aqui não tem isso não. Nós gostamos dos dois. Mimimi aqui não. Continuando, Star Trek foi pioneiro nas mais malucas idéias e conceitos espaciais que você possa imaginar e teve tanta importância que colocaram o nome de Enterprise em um ônibus em sua homenagem.
Mas no espaço real merdas reais acontecem. E não adianta gritar com o computador algum jargão técnico e esperar milagrosamente os escudos defletores subirem. Resolver um problema que ameaça sua vida envolve muito mais esforço num ambiente agradável de pânico, incêndios e fumaça tóxica.
Para glorificar a conquista humana do espaço, listamos 5 famosas missões espaciais que quase, mas quase mesmo acabaram em desastre.
5 - Neil Armstrong quase foi morto anos antes de pisar na lua
Os anos 60 eram uma época ruim para ser um cientista de foguetes americano. Os vermelhos estavam encantados com o belo chute no traseiro nos Yankees em todas as frentes, da cachorra Laika a Yuri Gagarin. E agora ambos miravam o alvo final: a lua. E a mensagem que vinha de Washington era clara: é melhor não estragarem tudo desta vez.
O maior problema com o item "Lua" no manual Guerra Fria na corrida espacial não era chegar lá mas sim pequenos detalhes como dividir o módulo, pousar, reagrupar e voltar. Simples. A NASA tinha resolvido estes detalhes desenvolvendo o famoso Lander System, que por sinal era uma belezura só: desacoplava, resolvia as delicadas questões de pouso de maneira sublime enquanto o módulo principal ficava orbitando a lua aguardando tudo até que o Lander se acoplava de volta e Voilá! Prepara a festa que a gente está voltando. E avisa os comunas que a vai ser grande a comemoração...
Essa era a teoria. Acontece que em algum momento a NASA se tocou que a tarefa era complicadíssima. Mas o relógio estava girando e eles foram praticar a missão. Em 1966 a NASA mandou David Scott e Neil Armstrong (ele) numa missão chamada Gemini 8. Objetivo? Completar o primeiríssimo acoplamento entre dois módulos, sendo que o primeiro, chamado de Agena, foi enviado anteriormente.
Sucesso. A missão foi que foi e depois de 6 horas do lançamento, Scott e Armstrong tinha se acoplado com a Agena. Tudo muito bom, tudo muito bem, e então começa o duplo-carpado-mortal-espacial-sem-fim. Um giro extremamente rápido no próprio eixo dos módulos acoplados.
Depois de 27 minutos de relaxamento após o feito, Scott deu uma olhada para fora percebeu que estava tudo girando. Uma falha do software causou um mal funcionamento dos foguetes de propulsão da Agena e eles soltavam agora um grito de fogo como um cowboy bêbado. Indiferente à real situação de ameaça à vida que passava na frente de seus olhos, Armstrong calmamente acionou os foguetes da Gemini para contra-balancear o giro e parar enquanto ele desligava os foguetes da Agena.
Isso resolveu o problema... por alguns segundos. O giro começou de novo, mais furioso agora. Percebendo que a nave estava em perigo real, Armstrong rapidamente acionou o desacoplamento, se separando da problemática Agena. De alguma maneira o giro não só continuava como tinha aumentado.
Merdas como esta acontecem de vez em quando no espaço e geralmente é resolvida com um simples Houston, we have a problem. Entretanto, a Gemini 8 estava temporariamente sem rádio no momento e eles não estavam conseguindo avisar o centro de controle da reviravolta (!) da missão: o problema era nos propulsores da Gemini.
O giro continuava ao ponto de atingirem 1 rotação por minuto. Era mais que suficiente para causar efeitos colaterais como tontura e perda do sentido de localização da Terra. Acredito que perder o sentido de localização da Terra deve ser bem ruim quando se está fora dela.
Neste momento, Armstrong decidiu que já era merda demais para um missão só. Sua visão começou a embaçar e quase no momento de perder a consciência, de algum jeito ouviu a voz do Yoda que dizia "Não vá para a luz" e incrivelmente descobriu o problema e o resolveu like a boss. Ele desligou os propulsores problemáticos e antecipou a reentrada na atmosfera, o que trouxe nossa querida Gemini de volta a estabilidade e permitiu que os astronautas recuperassem o fôlego. E numa aterrissagem emergencial, mas sem sustos, os heróis estavam salvos. E Neil Armstrong teve seu treinamento considerado completo e virou Jedi.
4 - Aterrissagem MacGyver de Gordon Cooper
O programa Mercury era o primeiro da NASA que envolvia missões tripuladas. E quando eu digo "tripulada" significa "tem um cara sentado lá enquanto a nave totalmente automatizada cuida de tudo". Como a NASA ainda lidando com a nova idéia de ter um ser humano na nave, eles queriam ter certeza que qualquer Homo Sapiens a bordo não comprometesse a missão com erros. Por isso eles construíram tudo de maneira automatizada para que eles ficassem sentadinhos e quietinhos. Foi então que os astronautas ganharam um novo apelido: spam in a can (presunto na lata em tradução livre).
Claro, até que surgiu Gordon Cooper.
O Sr. Cooper era o presunto da vez na Mercury-Atlas 9. Era a missão final do programa Mercury e todos estavam se sentindo bem, vendo todas as outras missões serem bem sucedidos. A NASA lançou o Sr. Cooper em órbita no dia 15 de maio de 1963 e tudo ia bem até então. Eis que Cooper começou a perder altitude, orientação e demais leituras. Isso era ruim, mas ainda sim administrável. Uma nave automatizada pode continuar funcionando mesmo que seu piloto não saiba o que está acontecendo, certo?
Mas isso tudo ainda era parte da grande merda que estaria por vir: Cooper ficou sem todo o sistema automática de estabilização e controle, sem o qual não é possível uma aterrissagem segura e não flambada. Então Cooper, cujo trinamento incluía instruções claras como "Fique parado e não mexa em nada", se tocou que ele mesmo teria que efetuar os cálculos da reentrada e pousar a nave sem nenhuma ajuda da sofisticada tecnologia da NASA. Para piorar a situação, a cápsula estava ficando cheia de dióxido de carbono.
Invés de levantar as mãos e gritar "Onde está a câmera escondida?", Cooper ativou o modo MacGyver. Improvisando, ele fez exatamente como um navegador do século 17 e se aproximou da lugar da reentrada usando a posição das estrelas como guia. Então usando nada além relógio de pulso, ele calculou o tempo que era necessário para ativar os retro-propulsores para reentrada. Sim, aquele monumento a tecnologia estava sendo confiada aos segundos de um relógio de pulso. E ele tinha que rezar que seu relógio fosse daqueles que continuam funcionando no espaço.
O relógio original usado por Cooper
Quando chegou o momento, Cooper percebeu que todos seus medos estavam corretos e a nave prontamente virou um forno humano. No fim, ele acabou realizando a mais precisa aterrissagem na água da história do programa, há apenas 4,4 milhas do navio de resgate. Precisão cirúrgica na escala "descendo gritando do espaço".
Sozinho, seu feito mudou a maneira que os astronautas eram vistos no design das naves. E nunca mais ninguém chamou um astronauta de Span in a can com medo que Cooper pudesse guiar um meteorito neles usando nada mais que um clip e um iô-iô quebrado.
3 - EUA e URSS celebram parceria numa missão conjunta e nave americana vira uma frigideira
Por volta de 1975 a corrida espacial já tinha terminado. Só era preciso uma cerimônia para registrar o fim. Com esse propósito, os EUA e a URSS concordaram em realizar uma missão conjunta: o projeto Apollo-Soyuz.
Foi tão elegante como uma troca de gentilezas pública pode ser: uma tripulação americana é lançada numa nave Apollo e encontrará dois cosmonautas na Soyuz 19. Uma vez que suas naves estivessem acopladas, seus respectivos capitães Thomas Stafford e Alexey Leonov apertariam as mãos numa conferência televisiva enquanto suas tripulações realizavam experimentos científicos totalmente vitais e sem propósito marketeiro.
Então as naves se desacoplaram e seguiram seus caminhos alegremente. Soyuz aterrissou seguramente menos de um dia depois, enquanto a Apollo ficou no espaço um pouco mais, aparentemente para realizar experimentos científicos de verdade antes de retornar à Terra.
Ou este era o plano. A reentrada foi marcada pela tripulação realizando os procedimentos numa ordem um pouco errada, que causou um balancê na nave. Numa tentativa de parar com a festa, os computadores de bordo automaticamente ajustaram os propulsores. Acontece que alguém deixou a tampa de uma das válvulas da cabine mal fechada e não era uma válvula qualquer: era a do tanque. O combustível começou a vazar. E você não precisa saber muita coisa sobre o espaço para deduzir que ter seu colo coberto com combustível de foguetes não é uma boa coisa.
Como se não bastasse o detalhe do combustível no seu colo, eles estavam numa ardente reentrada. O dito combustível? Tetróxido de Nitrogênio. Um nome tão apavorante quanto seus sintomas ao entrar em contato com você. Um veneno considerado mortal acima de 50 partes por milhão. A exposição na ocasião foi 15 vezes maior.
Claro que a dose mortal a qual os astronautas foram expostos junto com a temperatura agradável de uma reentrada fizeram a queda um processo confortável. Além disso tudo temos mais alguns detalhes como força G fraquinha, um reflexo natural de gritar "PutaQuePariuVouMorrer! SantaMãeDeDeusMeProteja!", irritação nos olhos, náusea, queimaduras nos pulmões e freqüência cardíaca de uma Ferrari numa Autoban.
Claro que ressuscitar um astronauta com sua máscara de oxigênio num ambiente com veneno suficiente para matar um regimento enquanto se está resolvendo uma coisinha chamada aterrissagem está nos treinamentos da NASA.
Depois do mergulho no oceano, os três passaram algumas semanas relaxando em hospitais de Honolulu, mas se recuperaram perfeitamente. Leve este acontecimento em consideração antes de chorar igual uma menininha quando queimar o dedo no fogão.
2 - NASA age como funcionário público que é e diz que está tudo bem com uma nave espacial secreta toda ferrada
Em 1988, uma nave chamada STS-27 foi lançada. Virtualmente nada é sabido sobre seus objetivos além de ser uma missão extremamente secreta do Departamento de Defesa dos EUA. O que todos sabem é como esse lançamento quase se tornou a maior chuva de estilhaços ultra-secretos da história e como a NASA não poderia ter sido mais negligente.
Durante o lançamento, uma peça de espuma protetora se descolou dos propulsores do STS-27 e revelando os pequenos ladrilhos que compunham o escudo contra o calor que revestia o fundo da nave. E quando dizemos escudo estamos falando do detalhe de engenharia que prevenia a nave de virar um amontoado de ferro derretido na reentrada.
Este incidente já acontecera antes e a tripulação suspeitava do problema então, no espaço, eles usaram um braço robótico com uma câmera para ver os estragos. O que eles viram foi o pior dano já sofrido por um escudo: 700 ladrilhos foram danificados, ao ponto de pelo menos um ladrilho ser completamente destruído. Vamos apenas reproduzir o que o comandante Robert Gibson disse na ocasião: Nós vamos morrer!
O ladrilho destruído
Ele então solenemente informou a NASA da situação era russa (!): – Não cara, isso aqui não é como trocar uma lâmpada. As imagens do estrago verificadas pela NASA eram muito ruins para avaliar o tamanho da nota para imprensa que eles teriam que emitir. Solução? Eles acharam, convenientemente, que o rasgo na nave era apenas um jogo de sombras e disseram para a tripulação que aterrissar não seriam um problema. Não é preciso dizer que os astronautas viram que a merda era grande demais e que Houston não iria ajudar.
O resto da missão ocorreu normalmente. A atitude que a tripulação resolveu tomar foi a de não se lamentar e esperar pelo forno humano que seria a reentrada e sarcasticamente raciocinar: "Por que morrer estressado?". Mais humor negro impossível... Gibson até preparou um discurso para entregar a NASA quando fossem recolher os pedaços da nave.
Contra todas as possibilidades, a bicha aguentou o tranco durante a reentrada e aterrissou sem maiores problemas. Neste momento, a NASA finalmente deu uma olhada no problema e viu claramente a estupidez da sua decisão admitindo que esse era de longe o pior dano já visto numa nave. Infelizmente não temos a réplica do comandante Gibson. Mas podemos imaginar...
1 - Uma história de cinema sobre a tripulação da MIR
Em 1986 a URSS começou a construção da poderosa estação espacial MIR. Ela cresceu para ser o maior objeto feito pelo homem a orbitar a Terra, até sua morte em 2001. Uma estação enorme como esta precisava de presença humana constante e portanto as primeiras missões estavam definidas: EO-1 e EO-2, ambas com 6 meses de duração.
Já em 1997, entre os grandes cortes de orçamento e a queda do interesse do público na MIR, a tripulação da EO-23 começava seus trabalhos na agora velha e rangente estação russa. Acidente à vista...
No dia 12 de Fevereiro de 1997 começava a missão. Menos de duas semanas depois, um incêndio químico tem início na estação. Labaredas de 1 metro deixaram as instalações mais quentinhas no módulo Kvant, causando destruição por 14 minutos. Depois do incidente, os astronautas tiveram que usar máscaras de oxigênio por longas duas horas e meia, porque depois de um entendimento geral, abrir a janela estava fora de questão.
Em Março e Abril foram deliciosamente presenteados com uma luta quase corporal com máquinas pouco importantes como o controle de temperatura, produção de oxigênio e remoção de CO2. Um verão para recordar...
Sem as doletas (hoje chamadas de Obamas), os aspones russos queriam saber então se uma acoplagem manual era possível para o resgate. A tripulação fez o teste em Julho respondeu para Moscow: "Não, cacete!" Tentaram então dois testes separados com robôs. O primeiro navegou gloriosamente para as profundezas do espaço sideral. A segunda tentativa foi ainda pior...
O então robô bateu na célula solar da estação e depois acertou em cheio o módulo Spektr. O dito cujo começou a se despressurizar rapidamente obrigando os astronautas a desligarem e selarem completamente o módulo para nunca mais ser aberto novamente.
Mas como este é uma missão russa, e com russos no comando, o dito módulo que foi fechado e desligado era o que administrava a energia da estação, que ficou sem energia. A MIR passou de estação espacial para um caixão. Até que eles conseguiram por a bagaça para funcionar mais ou menos novamente depois de duas semanas.
Passados os 6 meses, a tripulação da EO-23 estavam ansiosos para voltar a Terra. E como um capítulo final bacana, os foguetes da Soyuz falharam ao se aproximar do solo, expondo nossos heróis a uma das mais duras aterrisagens já vivida por uma tripulação.
E aí, gostou? De tempos em tempos tentamos publicar artigos envolvendo ciência para deleite de vocês. E fiquem à vontade para sugerir pautas para o Jedipress.
From: cracked.com